No dia 18 de Janeiro a Ubisoft lançou globalmente o jogo Prince of Persia: The Lost Crown para várias plataformas: PlayStation 4 e 5, Xbox Series X|S, Xbox One, Nintendo Switch e PC (via Epic Games Store e Ubisoft Store).
Foi o grande retorno da franquia Prince of Persia, desta vez através de um jogo de plataforma em 2.5D seguindo o estilo metroidvania.
A premissa é bastante simples. Você joga com Sargon, um jovem guerreiro que pertence a um grupo de elite chamado Os Imortais. Eles são enviados para o Monte Qaf com a missão de resgatar o príncipe Ghassan, que foi sequestrado. Tudo acontece logo após Os Imortais terem vencido uma grande guerra e são pegos desprevenidos durante a comemoração.
No passado, o Monte Qaf foi um local extremamente próspero e acolhedor. Por guardar conhecimentos importantes para a humanidade, ele era visitado por pessoas do mundo todo. No entanto, atualmente está amaldiçoado e hostil. Um lugar onde o tempo parou e perigosas criaturas passaram a habitar. Além disso, a maldição enlouqueceu a arquiteta da cidade que passou a espalhar armadilhas por todos os cantos.
The Lost Crown aposta na exploração, combate e resolução de enigmas em cenários variados inspirados na mitologia persa. Todas as regiões são interligadas e cada uma possui características bem distintas como ambientação, inimigos, objetos interativos, músicas e segredos.
Há uma caminho principal onde o jogador seguirá a história do jogo. Porém, existem muitas missões secundárias, com os mais variados objetivos, que estendem a experiência e reforçam a sensação de liberdade, mesmo não sendo um jogo de mundo aberto.
O mapa do jogo é bem extenso, se comparado a outros metroidvanias clássicos. As salas em geral são grandes e a distribuição de inimigos, segredos e passagens secretas é bem feita. Os elementos que diversificam cada região também são criativos e variados.
Para o jogador não ficar perdido, é possível marcar o mapa com ícones, facilitando a exploração. Mas, a grande novidade é poder tirar fotos da sala atual, assim o jogador tem mais certeza do que ele encontrou naquele local ou qual obstáculo o impediu de progredir.
No menu de pausa há uma aba para se localizar as missões. Ela segue bem o estilo que a Ubisoft usa em outros jogos e ajuda muito a relembrar o que se tem de pendente para completar.
De qualquer forma, no início do jogo existem duas opções de exploração, a livre e a guiada. No modo livre o jogador caminha pelos próprios pés na busca de concluir os objetivos. No modo guiado há marcações no mapa que informam qual local deve ser alcançado para prosseguir na campanha principal. O tipo de exploração pode ser alterado a qualquer momento nas configurações do jogo.
O combate é bastante veloz e é preciso estar atento a todo momento. Como segue a moda atual, há um grande foco em parry (aparar) e desviar. Os inimigos são traiçoeiros e você precisa aprender seus padrões de comportamento para vencer.
Em geral, nos metroidvanias clássicos, com Castlevania SOTN, o combate era simples, com opções de ataque comum, algum poder secundário e esquiva. Em outros jogos, como Batman: Arkham Origins Blackgate, as mecânicas seguiam o estilo “contra-ataque telegrafado”, o jogador vai fazendo combos até que aparece a indicação para ele impedir algum ataque iminente (praticamente um quicktime event), que foi popularizado pela franquia Batman Arkham.
E aqui em Lost Crown, a inspiração vem dos jogos como Dark Souls. Desde o início, Sargon tem pouca vida e isso não muda muito, mesmo posteriormente com todos os upgrades equipados. Ataques dos inimigos causam bastante dano e é preciso ficar esperto para desviar ou aparar (que ativa um golpe poderoso dependo do golpe defletido).
Todos os confrontos tem certo nível de tensão, mesmo com inimigos comuns, que podem atacar em bando e ao mesmo tempo.
Existem poções para recuperar a vida que até remetem aos primeiros Prince of Persia. Porém, são ativados ao pressionar para cima no direcional digital e ainda é preciso esperar terminar a animação do personagem. Outro fator que lembra jogos souslike são os Save Points. Em metroidvanias clássicos, inimigos ressurgem toda vez que você volta numa sala. Em The Lost Crown, os inimigos dentro de uma região do mapa permanecem mortos até que você salve seu progresso.
O jogo tenta trazer novidades ao gênero e ao mesmo tempo opta por uma maior simplicidade em alguns pontos. Tenho para mim que nesse gênero de jogo, a parte “metroid” se refere à exploração, buscas por upgrades e descoberta de segredos. E a parte “vania” seriam os elementos de RPG, com pontos de experiência, nível para personagem, melhora de atributos, com armaduras e itens para equipar. E nesse caso, Lost Crown é muito mais “metroid” do que “vania”.
Não existem pontos de experiência, nem árvores de habilidades para desbloquear. Sargon evolui apenas com poderes encontrados pelo mapa, derrotando chefes e com itens comprados em lojas. Sua build é construida a partir de amuletos que são equipados em seu colar nos Save Points. As melhorias são “ocultas”, não há contagem de números, você não tem noção de quanto dano está causando ou recebendo (tirando a referência visual da barra de vida). Então, sua experiência nesse ponto vai lembrar muito mais um Metroid.
Nas lojas e na forja existem muitos itens e melhorias para serem adquiridos, custando cristais (moeda mais comum) ou alguns itens mais raros. Esses cristais são encontrados mais facilmente durante os combates. Só que, como as batalhas são sempre trabalhosas, muitas vezes eu preferi apenas passar por telas ignorando os inimigos e focando em quebrar vasos pelos cenários, que também rendem cristais (mesmo que em menor quantidade).
Não que seja chato lutar contra os inimigos, mas quando você tenta juntar cristais para comprar algo, o menor erro pode te causar grande dano, o que vai te fazer voltar ao Save Point só para recuperar pontos de vida e tentar novamente. Repetir esse processo quebra um pouco a fluência do jogo. E mesmo quando você já está avançado na campanha, um inimigo do início do jogo ainda pode te dar trabalho.
Em metroidvanias clássicos, os combates rendem pontos de experiência e isso fazer o jogador ter a sensação que está ficando mais forte a cada luta. É um sentimento de progressão que se torna bastante visível posteriormente quando o jogador volta numa região passada e destrói facilmente um inimigo que antes era difícil de derrotar.
Por isso, em The Lost Crown, há momentos que parece não haver muito incentivo para enfrentar os inimigos todas as vezes que eles aparecem. Eles até rendem cristais, porém, após enfrentar umas duas telas cheias de inimigos, a vida do jogador pode estar no limite, e ele vai preferir se esquivar do que vier até chegar no Save Point. Fora isso as lutas funcionam bem em terrenos planos e amplos, mas se tornam muito perigosas em telas com muitas plataformas voadoras e pequenas, onde um golpe pode atirar o jogador longe de onde ele estava.
Sobre a jogabilidade do combate, além do ataque comum, há também especiais que são ativados através de uma barra que deve ser preenchida ao se acertar golpes comuns. Existem combos no chão, combos aéreos (embora nem todo inimigo pode ser arremessado ao ar). Pode-se atirar flechas ou o bumerangue e combinar poderes que são desbloqueados aos poucos, como a corrida no ar ou outros ligados a manipulação do tempo.
Com o único botão de ataque, Zargon pode fazer um combo de 3 hits com suas espadas no chão. Esse deveria ser o ataque padrão para quando não se tem algum outro poder disponível. Mas ele não é tão eficiente quanto deveria. Os dois primeiros acertos funcionam sem problema, no entanto, o terceiro hit tem um certo atraso, o que abre tempo para os inimigos desviarem, defenderem ou mesmo defletirem.
Após a primeira leva de inimigos, é quase impossível encontrar algum que aceite levar os 3 hits. Isso faz o jogador contar com apenas 2 acertos e em seguida é obrigado a partir para outra ação. Há um amuleto que adiciona um hit nesse combo, mas ele não faz o terceiro acerto ficar mais útil. E se parar para analisar, tem várias melhorias de amuletos que não servem para ou ou outro tipo de inimigo.
Outro detalhe que afeta a cadência do combate é a vida dos inimigos. Alguns são verdadeiras esponjas de dano e em toda tela você encontra três ou quatro. Ao comprar upgrades de força a coisa acelera um pouco, mas não o suficiente. Essas são minhas impressões correspondentes à dificuldade Normal do jogo. Existem outros dois níveis onde possivelmente os inimigos ganham ainda mais vida e causam mais dano.
Em todo caso, há uma boa variedade de inimigos que variam em cada região do mapa. Eles usam espada, lança e escudo, alguns voam, jogam veneno, etc. Variam entre soldados amaldiçoados, animais, fantasmas, criaturas bizarras e muitos outros. Cada um com seu estilo de luta, pontos fracos, padrões de movimentação. E como em todo bom metroidvania, possuem animações de morte bem criativas.
Os chefes também são bem variados e alguns até mesmo secretos. Eles tem aquela apresentação com nome na tela que lembram Mega Man ou The Legend of Zelda. E nesse caso, os combates são bem interessantes, desafiadores e recompensadores (afinal, ganha-se novas habilidades ao derrotá-los).
Diferentes de outros metroidvanias, The Lost Crown não gosta de avisar que há um chefe chegando. É bem difícil haver um Save Point colado a uma sala de chefe. Então toda vez que você salvar o progresso, poderá perder um pouco de vida num obstáculo que aparece até chegar no chefe. Ao menos, se você for derrotado, pode imediatamente tentar de novo.
Por não ser um jogo de grande escopo e com orçamento mediano, The Lost Crown não possui os gráficos mais avançados possíveis. Mas, eles são bem agradáveis e funcionais. O traço é cartunesco, os personagens são bem expressivos e tudo lembra muito o estilo visto em jogos MOBA. Os Imortais mesmo tem essa vibe de MOBA, por serem guerreiros poderosos com características, personalidades e poderes bem diversificados.
Se em MOBAs o estilo de gráficos simples é usado para que o jogo rode em PCs de qualquer capacidade, dá para dizer que em Lost Crown acontece algo parecido. Ele roda bem em todas as plataformas em que está disponível, incluindo no Nintendo Switch, que é o hardware mais defasado existente no mercado atual. Claro, existem diferenças de resolução e ligeiras perdas de desempenho, mas no grande geral é uma ótima versão que funciona a 1080p e 60fps.
Para todas as plataformas há uma demo disponível. Todos podem conferir como o jogo roda em cada console. Essa demo tem um trecho do jogo modificado especialmente para os jogadores entenderem como Lost Crown funciona. Mostrando vários inimigos, armas e poderes. A Ubisoft se mostrou bem confiante com esse jogo ao disponibilizar essa demonstração. Vale a pena dar uma conferida.
Ainda sobre gráficos, algumas cutscenes in-game são muito bem animadas (mesmo que não existam muitas). A abertura em CGI me lembrou animes como Dragon Ball. E as finalizações de batalhas contra chefe sempre mostram algo interessante.
Algo que chama muita atenção neste Prince of Persia é o ar de novidade que não é tão comum em jogos da Ubisoft. Num novo FarCry, Assassin’s Creed ou Just Dance, você sabe o que esperar, sabe que as mecânicas virão modificadas a partir do jogo anterior. Mas, com The Lost Crown sendo o primeiro metroidvania de sua franquia, tudo é novo e fresco. Isso com certeza anima muito quem está pensando em testar.
Numa possível continuação podemos esperar que muitos elementos retornem, porém, isso é assunto para o futuro. Futuro que com certeza irá acontecer pois o jogo atual foi muito bem recebido tanto pela crítica como pelo público.
Mas nessa boa recepção nem tudo são flores. Antes do lançamento cheguei a ver reclamações que não faziam o menor sentido. Uma delas foi sobre The Lost Crown não ser um remake de Sands of Time. Realmente não é um remake e nunca se propôs a ser. Alguns anos atrás a Ubisoft anunciou que estava refazendo Sands of Time, porém, aparentemente ele foi interrompido e tudo se reiniciou do zero. O desenvolvimento não foi cancelado, o jogo virá algum dia, então isso não é motivo para desdenhar de The Lost Crown.
Outra besteira absurda que li foi de pessoas dizendo que não iriam jogar Lost Crown porque “transformaram o príncipe num homem negro”. Essa afirmação mostra o quanto esse pessoal não sabe absolutamente nada sobre o jogo e estão baseando suas opiniões em coisa nenhuma. Sabemos bem quem é o Sargon e que ele e o príncipe são personagens diferentes. Enfim…
Vale a pena jogar The Lost Crown, principalmente por sua história. Ela é cheia de detalhes, tem várias reviravoltas e surpresas. Acontecem altos e baixos na aventura de Sargon e muitos momentos importantes envolvem seus parceiros do grupo de elite.
São cerca de 20 horas só para completar a campanha principal. Quem se dedicar a fazer tudo, terá mais algumas horas de diversão.
O jogo possui localização com menus e diálogos traduzidos em pt-br, mas não tem dublagem. Porém, há a opção de diálogos em persa, o que dá um gostinho diferente à experiëncia do jogador.
Nos últimos tempos tenho sentido uma diminuição nos jogos dublados por parte da Ubisoft. Achei estranho quando Riders Republic e The Crew Motorfest não vieram dublados (com The Crew 2 tendo dublagem, isso pareceu um passo para trás). E agora o mesmo aconteceu com The Lost Crown. Ainda assim, espero que todos os grandes projetos futuros tenham localização completa.
A tradução do jogo está muito boa. Erros nas legendas são bem raros, porém registrei dois casos. Num certo diálogo li “Cidadela Altac” (com um C sobrando).
E o outro caso é quando se compra dicas da Fariba. No menu aparece escrito “Dica de Compra”. Dá a impressão que você está pagando para ela te dar uma dica do que comprar com outras pessoas. O correto deveria ser “Compra de Dica”, já que a Fariba está te vendendo alguma pista sobre o que fazer no jogo.
A trilha sonora não decepciona. São 41 faixas (disponíveis numa playlist no Spotify) que ambientam muito bem e passam a vibe perfeita de cada região de Qaf. Elas foram compostas por Mentrix e Gareth Coker, mesclando instrumentos tradicionais persas e instrumentos contemporâneos.
O destaque vai para os temas de chefe introduzem uma guitarra nervosa, deixando tudo muito mais empolgante.
Os efeitos são bem variados e convincentes. No entanto, acredito que devem ter vindo de um grande banco de SFX da Ubisoft. Toda vez que quebro um vaso eu lembro do mesmo som em Assassin’s Creed Valhalla ou Mirage.
Todos os jogadores deveriam dar uma chance ao Prince of Persia: The Lost Crown. Os novatos, os veteranos, aqueles que ainda choram pelo adiamento do Sands of Time. Trata-se de uma experiência diferente. Não é perfeita, mas é divertida e desafiadora.
- Para este review, a Ubisoft nos enviou uma cópia versão PlayStation.
ANÁLISE
Prince of Persia: The Lost Crown
Após 14 anos, a franquia Prince of Persia retorna num jogo 2.5D seguindo o estilo metroidvania e invade todas as plataformas disponíveis de console e PC. É uma aventura nova divertida criativa e desafiadora.
PRÓS
- Cheiro de novidade
- Ótima exploração
- Gráficos agradáveis a 60 fps
- Roda bem até no Nintendo Switch
- Trilha sonora imersiva
- Enredo interessante e cheio de reviravoltas
CONTRAS
- O combate precisa de retoques, toma muito tempo e interfere na fluência do jogo
- Poderia ter vindo com dublagem pt-br padrão Ubisoft
- A falta de elementos de RPG torna o jogo mais "metroid"e menos "vania"