No dia do lançamento de Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge, a Dotemu nos enviou uma cópia do jogo. Após finalizá-lo tive a ideia de publicar uma review simples para aproveitar o hype de lançamento. Depois, pensando melhor, achei que seria mais interessante criar uma análise mais aprofundada, mesmo que o interesse do público em ler diminuísse.
O jogo foi produzido pela Tribute Games e publicado pela Dotemu. Está disponível para PC, Nintendo Switch, PlayStation 4, Xbox One e Game Pass.
Após um longo tempo de hiato, os beat n’ ups estão finalmente voltando a aparecer da melhor forma possível: em 2D clássico. Acompanho o gênero desde os tempos mais primórdios e, por conta disso, sou bastante crítico quando vou analisar. Considero alguns jogos mais recentes bastante medianos, por exemplo: Scott Pilgrim, 99 Vidas, Double Dragon IV. Mesmo ao grande sucesso de 2020, Streets of Rage 4, tenho várias ressalvas.
No entanto, TMNT Shredder’s Revenge está num patamar muito alto. Os produtores acertaram muito em termos de jogabilidade e torço para que os próximos jogos do gênero se inspirem nesse empenho em fazer tudo o mais divertido possível.
O enredo
Não sei se preciso dizer, mas o jogo é baseado nas Tartarugas Ninja do primeiro desenho animado que fez sucesso no final dos anos 80, incluindo também alguns personagens dos filmes da época. Em “A Vingança do Destruidor“, a história se passa após os eventos dos jogos clássicos Hyperstone Heist e Turtles In Time. Durante as fases, vários detalhes remetem a esses jogos, mantendo tudo muito familiar para os fãs das antigas.
Desta vez, Destruidor surge com um novo plano. Máquinas voadoras misteriosas cercam a Estátua da Liberdade. Enquanto isso, o corpo cibernético de Krang foi separado em pedaços e está espalhado por Nova Iorque. É curioso notar que foram tantas derrotas para os vilões que eles não tiveram nem tempo de se preparar direito. O próprio Technódromo está em reconstrução na Dimensão X.
Como de costume, as tartarugas estão em sua casa nos esgotos assistindo ao noticiário juntos da April e do Mestre Splinter. De repente, a transmissão é interrompida e Bebop anuncia o novo plano maligno: reformar a Estátua da Liberdade. Assim, os heróis partem para o prédio do Canal 6 e iniciam corrida para encontrar as partes de Krang.
Vários locais icônicos do desenho e dos jogos reaparecem com muito mais detalhes. Por exemplo, agora vemos as tartarugas invadirem o andar onde as filmagens são feitas no Canal 6. Outras fases se passam nos esgotos, becos, topo dos prédios, pontes, etc. E novos cenários surgem como os céus da Nova Iorque, o lado de fora do Technódromo na dimensão X, o zoológico, o shopping, o parque de diversões, entre outros.
São 16 fases, fazendo desse o mais longo beat n’ up 2D das tartarugas. Em geral, jogando sozinho, leva-se cerca de duas horas para completar o Modo História. Jogando com amigos tudo vai um pouco mais rápido, ainda mais quando seis jogadores estão reunidos.
Gráficos
Graficamente, Shredder’s Revenge (TMNT:SR) segue o estilo de pixelart 2D retrô muito utilizado em jogos atuais. A tela é widescreen, sem limitação de cores e uma paleta menos saturada para cenários. Os personagens (jogáveis ou não) tem uma alta taxa de quadros de animação e coloração mais forte.
Conforme dito anteriormente, há muitos detalhes nos cenários. Alguns remetem a outros jogos ou até mesmo franquias. Quem não lembrou do arcade dos Simpsons naquela parte do parque onde existem balões pra encher apertando o botão rápido?
O início de algumas fases mostram ao fundo o chefe da fase anterior todo derrotado, fugindo ou sendo pego por alguma armadilha, dando assim um senso maior de continuidade. Já na batalha contra o Rei Rato dá para ver sua nave destruída, a mesma que ele usou no Turtles in Time de SNES.
No quesito de inimigos fomos bem servidos. Os clássicos soldados do Clá do Pé retornaram com várias armas e cores diferentes. Alguns tipos são exclusivos de certas fases, variando bem durante todo o jogo. Além disso, outros inimigos são adicionados conforme o jogador avança e nunca fica repetitivo: Soldados de Pedra, Mousers, Tubular Transports, Robot Walkers e variações de alguns deles.
Sobre os chefes, também há uma boa e vasta seleção. Os clássicos como Bebop, Rocksteady e Baxter Stockmann não ficaram de fora. Ainda assim, há alguns bem inesperados vindos das temporadas mais avançadas do desenho animado ou que apareceram apenas em TMNT 3: Manhattan Project do NES. Alguns vem até mesmo do jogo de luta TMNT Tournament Fighters. Estreantes não poderiam faltar, Tempestra é um deles.
Som
A trilha sonora foi assinada por Tee Lopes, o responsável pela música de Sonic Mania e do DLC Mr.X Nightmare de Streets of Rage 4.
O estilo dele é bastante perceptível e em certas faixas dá para notar um arranjo parecido com o encontrado em Sonic Mania. Embora tenha uma vibe diferente das composições dos antigos jogos da Konami, não é ruim e funciona bem.
No geral, as músicas são bem animadas e combinam com os estágios. Mais uma vez elas adaptam o tema principal do desenho animado em certos trechos, deixando tudo muito familiar para os fãs. Nenhuma música ficou tocando na minha cabeça após jogar, mas acredito que isso virá com o tempo, afinal, não dá para comparar composições recém lançadas com temas dos jogos clássicos que existem há quase 20 anos (e são muito fáceis de lembrar).
Existem duas faixas cantadas além da abertura. Uma delas toca na fase de perseguição aérea e trata-se de um pop-rock que remete muito a filmes de ação que passavam na “Sessão da Tarde” dos anos 90. Essa música combinou demais com a vibe do jogo, com a temática da fase e adiciona uma camada a mais de nostalgia.
Já a outra faixa cantada toca no embate contra o Destruidor. Trata-se de um rap sem graça e que ficou bem deslocado. Geralmente, as lutas do Destruidor tem um tema mais agitado que exalta seu poder e sua maldade. Para compensar, Krang tem um tema novo que lembra sua música clássica e engraçada do primeiro arcade (que repete em TMNT 2 e 3 de NES).
Os atores das vozes originais americanos das tartarugas retornaram nesse título e isso deve ter sido bastante nostálgico para os fãs nos Estados Unidos. Para nós, não fez muita diferença, porém, mostra como a Tribute se empenhou em muitos detalhes para tornar esse jogo memorável.
As vozes em si são muito boas e variadas. “Pizza Time!”, “Cowabunga!” e outras estão presentes. Apenas senti falta do “Shell Shock!” quando alguma tartaruga perde uma vida. Em substituição a isso, cada personagem tem uma “fala de morte” diferente.
Jogabilidade
É aqui onde TMNT Shredder’s Revenge (TMNT:SR) brilha muito. O trabalho feito em relembrar todos os jogos clássicos foi concluído com maestria. São tantas opções de golpes e habilidades que não faria sentido citar tudo.
A Tribute se mostrou bastante entendedora do gênero beat n’ up (além de grande fã dos jogos de luta). Os produtores souberam trazer cada detalhes dos jogos anteriores e organizar de maneira que tudo fizesse sentido. O foco é o combo e a agilidade. Tudo te incentiva a ir pra cima dos inimigos e você sente que pode fazer isso, aprendendo novas táticas conforme se diverte jogando.
É necessário fazer uma comparação com Streets of Rage 4 (SoR4), um jogo que foi bem aclamado quando saiu, porém, possuía problemas bem notáveis. Partindo do princípio que Streets of Rage 3 (SoR3) foi um jogo divisivo, os produtores ignoraram tudo o que ele trouxe de novo (tanto coisas boas como ruins). Assim, SoR4 foi criado em cima de SoR2, adicionando novidades na jogabilidade, possibilidades de combo, novos golpes, etc. Ele ignorou melhoras de mobilidade e velocidade de SoR3, se tornando um jogo mais lento e limitado. Em pleno 2020, faria sentido algum jogo de beat n’ up não incluir corrida e esquiva para todos os personagens? O gênero beat n’ up evoluiu muito desde os anos 90 e esses movimentos são praticamente obrigatórios em jogos novos.
Em SoR4 só um personagem corre e ninguém tem opção de defesa ou desvio. Enquanto isso, os inimigos são ultra habilidosos. Dos comuns aos chefes, muitos tem corrida, esquiva, golpes demorados com invencibilidade, escudos super resistentes. E seu personagem tem poucas ou nenhuma opção para escapar. Um desequilíbrio que nunca havia acontecido em SoR 1, 2 ou 3.
Assim, parece que SoR4 foi criado como uma linha do tempo alternativa onde SoR3 não existe. E no meio disso, SoR Remake, um simples fangame, abraçou melhor toda a franquia, conseguindo reunir o melhor de cada jogo e até mesmo permitindo que o jogador configurasse algumas características a seu gosto.
TMNT:SR seguiu essa linha. Os golpes dos jogos clássicos estão de volta, de uma maneira ou de outra. Você quer jogar o inimigo longe(TMNT 3)? Você quer arremessá-lo na tela(Turtles in Time)? Você quer bater o soldado várias vezes no chão (Hyperstone Heist)? Dá pra fazer tudo isso!
Em termos de mobilidade, não há defeitos. Todos os personagens podem correr, desviar, usar escapadas de emergência e levantar rapidamente quando cai no chão. Isso ajuda muito para o jogador não precisar ficar na defensiva e deixa tudo mais dinâmico. Até mesmo durante a esquiva pode-se fazer alguns ataques e anular investidas adversárias. Nenhum personagem é pesado demais ou parece menos ágil que os inimigos.
Em Turtles in Time(TiT) e Hyperstone Heist (HH) havia várias opções de voadora que às vezes até atrapalhava um pouco. Mas agora elas foram reorganizadas. Uma delas está no pulo duplo, o chute pra cima (das voadoras antecipadas) virou um anti-aéreo de alguns personagens, entre outras mudanças. Então, você reconhece o golpe, mesmo que ele esteja realizando outra função.
Nos jogos anteriores, TMNT 3, TiT e HH, o agarrão principal era um movimento muito poderoso, seja para tirar vida do inimigo ou acertar vários outros ao redor. Em TMNT:SR isso foi um pouco reduzido já que foco está nos combos. Assim como em SoR4, agora os inimigos ricocheteiam no canto das paredes. E o jogador ainda possui um golpe de baixo para cima que ajuda a continuar batendo no ar. São muitas possibilidades para dominar a situação dos combates e se sentir mais forte que os inimigos, esse elemento é o que torna os beat n’ up divertidos ou não.
É comum em jogos desse estilo que os ataques especiais consumam um pouco da barra de vida para salvar o jogador quando ele está cercado de inimigos. Em TMNT:SR esses golpes funcionam como nos jogos de luta. Não gastam vida, mas gastam um nível da barra de especial (que é preenchida conforme se usa ataques normais). São 3 tipos de especiais por personagem. Ativados em pé, no ar ou desviando.
Esses golpes são bem poderosos e também ajudam a manter os combos. Sua única desvantagem é que não podem ser usados sempre a qualquer momento, somente quando a barra está cheia. Ao menos é possível recuperá-la mais facilmente usando o botão de provocação.
Como nos RPGs, ganha-se experiência ao derrotar os inimigos e os personagens evoluem até o nível 10. As melhorias de cada nível pode ser o aumento da barra de vida, estocar mais níveis de barra de especial, algum movimento novo e até mesmo desbloquear o Modo Radical, que aumenta o dano que um personagem pode causar por tempo limitado.
Já havia citado a paixão da Tribute por jogos de luta, mas é preciso ressaltar isso ao comentar os golpes dos personagens. A April é o maior exemplo, possuindo golpes de personagens do Street Fighter como Karin, Chun-li e Akuma. Ela até mesmo anda como a Cammy. Nos outros personagens é possível notar o “torpedo” do E.Honda com o Michelangelo, o “shoryuken” de Sol Bad Guy (de Guilty Gear) com o Raphaek, entre muitos outros.
Quem manja dos jogos de luta vai ficar um bom tempo reparando nos movimentos de cada personagem.
Até os inimigos tem essas referências. Uma bem óbvia é a dos Robot Walkers que soltam um raio vermelho claramente inspirado no laser curto do Ciclope nos jogos de luta da Capcom, mais especificamente, de X-Men Children of the Atom.
No geral, é divertido vencer cada tipo de inimigo. Eles tem movimentações e padrões específicos fáceis de identificar. Os que mais dão trabalho são os robozinhos menores, mas nada muito irritante.
São três níveis de dificuldade: fácil, normal e difícil. O normal é relativamente tranquilo, finalizei o Modo História por ele sem perder todas as vidas. Mesmo os chefes ou a batalha final não foram muito complexas. No entanto, quando testei o modo difícil, a coisa pegou. Todos os inimigos tiram muito mais vida e são mais ofensivos.
Modos de jogo
TMNT:SR tem apenas dois modos de jogo, o História e o Arcade. No primeiro é possível salvar o progresso e a evolução dos personagens, andar pelo mapa para escolher as fases e encontrar alguns aliados para realizar a missão secundária de entregar certos itens achados nas fases. Também dá para ir para a toca das tartarugas e verificar o progresso, os tutoriais, entre outras coisas. Algo que a tela do mapa não mostra é que dá para apertar o botão de voltar para ir para a tela de seleção de personagens e escolher outro. Por um bom tempo joguei com um personagem só até me tocar disso.
No Modo Arcade as fases acontecem na sequência, sem opção de voltar ou salvar, e ainda conta com vidas limitadas. Eu chamaria esse modo de “Modo Arcade para jogos convertidos para console” pois é nesses jogos onde havia vidas limitadas. Afinal, num arcade verdadeiro você tem quantas vidas quiser, dependendo de quantos créditos comprar.
Em qualquer modo pode-se jogar com amigos, tanto offline como online, indo até 6 jogadores simultâneos. Podendo ser com amigos convidados ou com estranhos.
Eu joguei online em 3 pessoas e achei bem divertido, mesmo que as coisas ficassem um pouco mais caóticas na tela. O recurso de transferir um pouco da vida a um aliado ou reanimar quando alguém perde uma vida ajuda muito a fazer o conceito de cooperação funcionar.
Existe crossplay entre Xbox e PC, mas não com consoles PlayStation, quem sabe isso não muda futuramente, não é?
Infelizmente, o maior defeito de TMNT:SR é a falta de modos adicionais. Não existe um Survival, Boss Rush, Versus, nem nada do tipo. Não duvido que isso poderá vir um DLC futuramente, mas por enquanto são apenas dois modos disponíveis.
Além de completar os colecionáveis do Modo História, é possível desbloquear Casey Jones, evoluir todos os sete personagens (cada um possui uma imagem de finalização diferente) e completar os desafios de cada fase (alguns são bem difíceis).
Bugs e problemas?
Não tive problemas de desempenho, lentidão ou travamentos. Tudo rodou muito bem no PS4 Pro. Vi na internet alguns relatos sobre erros que acontecem na versão do Switch ao iniciar. Torço que isso já tenha sido resolvido, não parece ser algo muito complicado de arrumar.
Sobre bugs, apenas uma vez aconteceu comigo. Ao jogar online, um soldado de escudo que derrotei ficou colado na minha tartaruga, para onde eu ia, ele acompanhava, foi assim até terminar a fase. Não me impediu de prosseguir, só achei engraçado. Talvez seja um problema por estar online, pois durante as fases que joguei offline não notei nenhum problema.
Falando mais sobre o online, mesmo com ping alto não tive problemas com inimigos comuns. Só na batalhas contra chefes que se movimentam muito eles começaram a pular de lugar. A picape do Bebop na terceira fase é a que mais “teleportava” pelo cenário.
A localização deu um toque a mais, trazendo nomes e falas que estamos acostumados a ouvir desde o primeiro desenho animado. Acho que o único termo não traduzido foi o Technódromo que permaneceu como Technodrome, mas isso é coisa mínima.
Pela internet
Vi muitos elogios sobre a alto nível de produção de TMNT:SR. E realmente é de tirar o chapéu. Algumas poucas reclamações foram sobre os personagens serem quase SD. Nas tartarugas (e animais no geral) quase não dá para perceber isso, mas nos humanos nota-se que eles são mais baixinhos e cabeçudos. Verdadeiros “Mini-Craques da Coca-Cola”.
Quando vi isso nas primeiras imagens de divulgação do jogo eu também estranhei, mas acho que me acostumei e sinceramente não acho ruim. Na real, bato palmas por terem mantido o estilo de pixel art extremamente bem animado, é um charme dos jogos antigos que sempre precisa ser relembrado e homenageado.
Veredito
Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder’s Revenge é com certeza o melhor beat n’ up da geração atual. Ele é bem mais completo e duradouro que os jogos antigos em 2D. Foi feito para agradar a todo tipo de fã dessa série ou dos outros jogos do gênero. Trouxe pontos positivos de todos os outros jogos e adicionou muitas novidades. E ninguém vai se sentir sozinho com a opção de se conectar com outros jogadores em todos os modos de jogo disponíveis.
Torço que um futuro Streets of Rage aprenda com esse jogo e entenda o que fez ele acertar muito mais. Falando nisso, com tanto jogo antigo voltando, o que seria bom vir agora? Um Final Fight? Um Captain Commando? Um Double Dragon decente?
- A Dotemu nos enviou uma cópia do jogo para essa analise. Testado num PS4 Pro
ANÁLISE
Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder's Revenge
Teenage Mutant Ninja Turtles: Shredder's Revenge é com certeza o melhor beat n' up da geração atual. Ele é bem mais completo e duradouro que os jogos antigos em 2D. Foi feito para agradar a todo tipo de fã dessa série ou de jogos do gênero. Trouxe pontos positivos de todos os outros jogos e adicionou muitas novidades. Ninguém vai se sentir sozinho com a opção de se conectar com outros jogadores em todos os modos de jogo disponíveis.
PRÓS
- Grande homenagem aos jogos clássicos
- Reúne mecânicas antigas com novidades divertidas
- Muitos personagens pra jogar
- Ótimo sistema de combos, mobilidade e esquiva
- Campanha dura mais que os jogos clássicos
CONTRAS
- Possui apenas dois modos de jogo