Se tem algo que marca a vida de todo mundo é o primeiro amor durante a adolescência. Esse é o tema principal de “Garota do Século 20” (20th Century Girl), o novo filme original da Netflix, escrito e dirigido por Bang Woo-ri (estreando na direção) e estrelado por Kim Yoo-jung, Byeon Woo-seok, Park Jung-woo e Roh Yoon-seo.
A história passa em 1999, uma época que por algum motivo os roteiristas coreanos adoram abordar. Existe um grande esforço para trazer a ambientação da época passando por roupas, costumes, aparelhos eletrônicos e um estilo de vida bem diferente do atual. Pode-se citar outras obras que seguem essa ideia como Reply 1997, Reply 1994 e até mesmo Vinte e Cinco-Vinte e Um (embora os roteiros sejam bem diferentes).
Tudo isso carrega uma nostalgia que fisga o telespectador (notei que acabei de me responder sobre o motivo citado acima). Funciona mesmo para quem não viveu essa época na Coreia do Sul pois está tudo lá: pagers, celulares simples, fitas cassete de música, locadoras de VHS, conversa através de e-mail no Windows 98, etc. E assim, o filme pode ser aproveitado por pessoas de todas as idades, mesmo que aborde um romance adolescente.
A protagonista de 17 anos é Na Bo-ra (Kim Yoo -jung), ela está no ensino médio e é amiga de Kim Yeon-doo, uma garota com um sério problema de coração. Para se curar dessa doença, Yeon-doo precisa passar por uma cirurgia nos Estados Unidos, mas antes de ir, ela deixa uma missão para Bo-ra: descobrir tudo sobre o garoto que ela gosta, o Baek Hyun-jin (Park Jung-woo).
Super fiel à amiga e extremamente dedicada, Bo-ra passa a seguir Hyun-jin por todos os cantos da escola, enquanto anota as informações num caderninho. Mais tarde, ela passa tudo para Yeon-doo via e-mail.
A sinopse oficial do filme diz que tudo começa a desandar quando Bo-ra se aproxima demais de Hyun-jin e começa a gostar dele também. Esse resumo é um tanto polêmico pois faz a gente duvidar da índole da protagonista Bo-ra, afinal, parece que ela vai tentar roubar o garoto de sua melhor amiga. Porém, posso garantir que não é assim que as coisas acontecem.
O roteiro é cheio de pegadinhas e explicações para tudo o que acontece. Bo-ra é inocente de tudo, mesmo que algumas confusões tenham acontecido. De início dá até para ficar um pouco confuso com as informações que temos, mas há um momento em que tudo se encaixa e percebemos o quão complicada é a situação em que Bo-ra se meteu.
Durante suas investigações, ela é descoberta por Poong Woon-Ho (Byeon Woo-seok), que faz parte do clube de audiovisual da escola e é um amigo muito próximo de Hyun-jin. É ele quem fornece as maiores informações de seu amigo para Bo-ra, e assim, se aproxima bastante dela.
Depois disso, temos a volta de Yeon-Doo, acontecem passeios escolares, briga de rua, visita ao parque de diversões e muitas outras coisas.
Como eu disse no início, o foco é mostrar tudo sobre o primeiro amor. A descoberta, a falta de experiência, os momentos felizes, as decepções. E o filme trabalha bem todos esses aspectos. O espectador precisa estar preparado para tudo isso. É uma verdadeira montanha-russa de emoções do começo ao fim.
A história é contada a partir de uma Bo-ra vinte anos mais velha, interpretada pela atriz Han Hyo-joo, que permaneceu trabalhando com audiovisual. Ela atende uma ligação de seu pai no smartphone avisando que ela recebeu um pacote com uma VHS, o que a faz relembrar do passado.
Isso é retratado em toda a fotografia do filme que sempre possui filtros coloridos nas cenas de 1999. Muitas vezes os fundos são desfocados ou possuem uma luz forte. Aparentemente, a intenção era passar uma ideia de que estamos vendo memórias da Bo-ra.
São muitos os pontos positivos desse filme. Não existem personagens chatos ou inúteis, eles são bem construídos e cumprem seu papel, chegando a surpreender várias vezes. Os conflitos são resolvidos sem muita enrolação e fazem sentido. Os casais tem química e a forma como demonstram seu amor é bem convincente. O final consegue ser imprevisível mesmo dentro da proposta que ele apresenta. Não dá para prever o que vai acontecer até o último segundo.
Bo-ra, a garota do século 20, sem sombra de dúvidas é a personagem mais importante e a mais desenvolvida durante a trama, já que exploram vários aspectos de sua personalidade.
De forma cativante ela demonstra todo seu empenho em cumprir a promessa para sua amiga. Seu esforço é tão grande que ela até esquece outros afazeres e deveres da escola. É muito real a forma como ela começa a se sentir estranha quando sente que seu coração está sendo roubado por alguém.
Existe um pouco de exagero voltado para comédia quando ela chora feito criança em certos momentos, mas é um exagero bom e que não destoa do resto do filme. A falta de experiência ou maturidade faz com que ela nem sempre tome as melhores decisões, porém, é uma garota de atitude que consegue surpreender com sua criatividade imprudente.
Garota do Século 20 merece ser visto por toda a experiência que ele proporciona, independente de como ele conclui sua história. É uma verdadeira viagem ao passado com passagem por todos os tipos de emoção que se pode esperar dessa época.
Antes de estrear na Netflix, o filme teve várias pré-estreias, tendo sua primeira exibição no BIFF 2022 (Busan International Fim Festival), um dos mais importantes eventos de cinema asiático. Desde então, o elenco principal e a diretora já realizaram muitas coletivas de imprensa e uma exibição para famosos e amigos.
Hoje, no segundo dia após o lançamento, ele está entre os assuntos mais comentados mundialmente no Twitter. A Netflix Brasil chegou a postar trailers legendados semanas atrás, alguns até com efeitos na imagem traduzidos, porém, no dia de estreia nada foi postado nas redes sociais.
Enquanto isso, as contas Netflix da Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão e várias outras divulgaram trailers ou imagens para comemorar e divulgar. É uma pena que por aqui passou em branco, já que outros conteúdos coreanos estão sempre aparecendo.
As filmagens tiveram inicio no final de 2021, quando a pandemia estava muito mais forte na Coreia do Sul, então não deve ter sido uma tarefa fácil tanto para os atores como para a equipe de produção. Ainda assim, não parece ter afetado a qualidade das cenas ou do andamento do filme. É bacana ver que as críticas internacionais, de quem viu nas pré-estreias, foram bastante positivas.
Muitas críticas ressaltavam um ótimo desempenho da atriz Kim Yoo -jung em dar vida a Na Bo-ra. Alguns disseram que sua atuação era parecida com a de Jun Ji-hyun no filme My Sassy Girl (2001), porém, com um tempero a mais no atrevimento. E realmente, os momentos de comédia da Bo-ra são muito bons. Quem acompanha a carreira da Kim Yoo-jung vai reconhecer pedaços de outros papéis dela na Na Bo-ra, desde as dancinhas na locadora de seu pai, até o taekwondo ou os momentos de bebedeira.
Em uma das coletivas, a diretora Bang Woo-ri revelou que enquanto escrevia o roteiro, ela pensava justamente na Kim Yoo-jung para interpretar a Na Bo-ra e ficou extremamente feliz quando o papel foi aceito. E foi somente nesse momento que a Yoo-jung ficou sabendo disso.
Han Hyo-joo e Kim Yoo-jung já trabalharam muitas outras vezes juntas. Elas já foram mãe e filha certa vez, já interpretaram a mesma personagem em idades diferentes (por duas vezes) e agora acontece novamente com a Na Bo-ra. Além disso, são grandes amigas e costumam se encontrar de vez em quando para trocar umas figurinhas.
Quem assistiu Céu Vermelho (ou Lovers of the Red Sky, de 2021), onde a Kim Yoo-jung viveu a protagonista Hong Chun-gi, vai notar a aparição especial de Gong Myung, que estava no mesmo k-drama. Talvez mais participações tenham acontecido, vou ficar ligado quando reassistir.
A dublagem em português está muito boa. A Roh Yoon-seo aparentemente manteve a mesma dubladora de Amor e Outros Dramas (Our Blues, 2022). Não posso negar que estranhei um pouco ver a Kim Yoo-jung dublada, após ter visto tantos filmes e doramas com sua voz original. Sua dubladora é diferente da escolhida no filme A Oitava Noite, (onde ela possuía pouquíssimas falas). Dessa vez escalaram a Bianca Alencar (@biancaalencarof) que conseguiu criar uma ótima versão em português da Bo-ra.
Mais ou menos na metade de 2021 eu vivia dizendo que várias atrizes coreanas tinham vários trabalhos na Netflix brasileira, e não havia nada da Kim Yoo-jung. No máximo tinha uma pequena participação dela (não creditada na plataforma) em Caim e Abel (2009), onde ela aparecia rapidamente numa cena de flashback como a versão mais nova de uma das personagens principais. Curiosamente, esse k-drama nem está mais no catálogo.
De lá para cá muita coisa com a Kim Yoo-jung entrou no catálogo: os k-dramas Fadas da Limpeza (2018), Love in the Moonlight (2016) e Backstreet Rookie (2020), o filme A Oitava Noite (2021), e agora Garota do Século 20.
Foi uma espera de um ano e alguns meses que para mim valeram a pena. É um filme que cativa e me fez ter vontade de que fosse um k-drama com uns 16 episódios. O elenco é bom é merecia mais tempo junto em tela. Gostei de ver a boa recepção, pelo menos entre a crítica especializada, já que o fandom dorameiro está um pouco dividido pelo final não ser tão clichê.
ANÁLISE
Garota do Século 20
A história de Na Bo-ra nos leva de volta ao final dos anos 90 e podemos reviver todas as emoções e sentimentos que o primeiro amor traz.
PRÓS
- Abora um tema que todos podem se identificar
- Traz uma nostalgia até para quem não viveu
- Trama bem amarrada
- Personagens interessantes e funcionais
CONTRAS
- O final pode desagradar quem não curte nada muito fora do clichê